Tayna Silva Marcelo — ASCOM
Quando se apresenta, Ystael Rocha costuma brincar: “Sou suspeito pra falar, porque sou praticamente uma cria do programa Árvore da Vida.” E não é exagero. Dos 12 aos 23 anos, o projeto foi seu segundo lar. Mas a história vai além da memória afetiva, é um percurso de vida marcado pelo impacto da educação transformadora, pela potência dos ciclos e pelo protagonismo que a missão da AVSI propõe a cada pessoa envolvida.
Natural de Betim–MG, Ystael conheceu o programa ainda adolescente, por influência da mãe e da tia, que colocaram seu nome na lista de interesse para as oficinas do Árvore da Vida. Começou em 2007, com apenas 12 anos, participando da oficina de percussão. Em apenas quatro meses, estava no palco do Expominas, cantando com crianças da dança e da percussão “uma apresentação inimaginável”, relembra.

Daí em diante, a trajetória foi intensa, Ystael permaneceu nas oficinas socioculturais até os 15 anos, quando fez a transição para os cursos profissionalizantes do projeto, como Informática, Auxiliar Administrativo e Jovem Empreendedor. Foi nesse contexto que surgiu o convite para atuar como monitor: uma transição desafiadora. “Estava do lado dos colegas como educando e, de repente, estava ali orientando. Foi uma virada de chave.”
“A maior virada foi entender que agora eu estava do lado de cá, orientando, depois de anos como aluno. Foi um desafio enorme, mas recebi apoio e acreditei que era capaz”, conta.
Entre 2011 e 2017, Ystael foi monitor, educador de flauta e violão, formador humano e também animador das ações de entretenimento infantil nas escolas da comunidade. Criou vínculos com as crianças, se caracterizou em peças de teatro de fantoches, cantou cirandas em escolas da comunidade, ajudou a ambientar novos beneficiários e liderou iniciativas com propósito formativo e afetivo. “Vivi minhas maiores alegrias aqui. Também momentos difíceis, mas foi nesse ambiente que encontrei apoio.”

Em 2017, sentiu que era hora de buscar novos caminhos. Iniciou a graduação em Administração e, no dia do próprio aniversário, se despediu do projeto. “Eu era feliz, mas precisava me descobrir fora daqui.” A decisão, difícil e simbólica, não foi um ponto final, mas o encerramento de um ciclo — como ele mesmo ensinava nas formações humanas.
Nos anos seguintes, atuou como voluntário e depois como profissional em uma ONG, em Contagem–MG, chegando a atender mais de 200 crianças e se especializando na área de controladoria. Passou também por experiências fora do terceiro setor, até que, em 2024, o caminho se reconectou com o Árvore da Vida.
“Recebi o convite para voltar ao projeto, agora com o Robótica. Mas o vínculo era tão forte que precisei conversar com minha psicóloga. Eu me perguntava: será que devo aceitar? Será que vai ser bom mesmo? Era o mesmo tipo de medo de quando fui monitor pela primeira vez. E foi aí que percebi: estava pronto. Era o momento certo.”
Hoje, como técnico social, Ystael atua diretamente com as turmas do projeto Robótica, acompanhando a formação humana e fazendo visitas domiciliares (o mesmo tipo de visita que recebeu quando era aluno). “Fui o menino visitado, hoje sou quem visita. Fui aluno, hoje dou apoio aos educadores. E essa experiência, para mim, é indescritível.”

Além da função que Ystael desempenha, ele vê propósito. “Cada decisão que tomei me trouxe até aqui. E hoje consigo entregar aos jovens oportunidades que eu mesmo recebi. Se eu puder ser a pessoa que entrega o lápis para que eles escrevam a própria história, já estou fazendo minha parte.”
Ystael se reconhece como protagonista de sua trajetória. Mas não um protagonista solitário. Ao contrário: cada passo foi guiado pela comunidade, pelos educadores, pela equipe, pela mãe e pela própria AVSI Brasil. “Tudo o que eu ensinava sobre ciclos, mudanças e recomeços eu vivi na pele. E isso me dá clareza pra falar do propósito da AVSI: formar pessoas que sejam agentes de transformação.”
Ao andar pelo bairro, encontra ex-alunos. Muitos são irmãos de jovens que agora estão no projeto. Percebe neles as reflexões que ele mesmo já teve. “Às vezes o jovem chega sem saber o que quer da vida. E quando ele começa a pensar sobre isso, você vê que algo ali está mudando. Esse é o nosso pagamento diário. É ali que o trabalho faz sentido.”
Se pudesse encontrar o Ystael de 12 anos, aquele que entrou na oficina de percussão com o nome deixado pela mãe, diria apenas: “Siga em frente. Vai dar certo.”
E deu.